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Segunda, 30 Abril 2018 10:08

Um inequívoco episódio de perturbação à ordem

O que é “manifestar”? Quando recorremos ao dicionário, encontramos uma inequívoca definição que nos ajuda a compreender os recentes episódios ocorridos em Malanje e, de certa forma, em outros casos já registados no nosso País. Vejamos: a palavra “Manifestar” como verbo transitivo deve ser compreendida como 1. tornar manifesto; patentear; revelar; expor. 2. exprimir; declarar. 3. publicar. Quando usada como verbo pronominal – 1. dar-se a conhecer; abrir-se. 2. expor a sua opinião. 3. revelar-se; mostrar-se.

Por Eduardo Magalhães*

O artigo 47º da Constituição da República de Angola impõe limitação no exercício da manifestação, como a não violência. E a Lei Sobre o Direito de Reunião e das Manifestações, de Maio de 1991, é clara no seu Artigo 1.°, que preceitua sobre o “âmbito”: 1. É garantido a todos os cidadãos o direito de reunião e de manifestação pacífica, nos termos da Lei Constitucional e da presente lei. 2. É interdita a participação de militares, forças paramilitares e militarizadas em reuniões de natureza política e em qualquer tipo de manifestações.

Observa-se na mesma lei de Maio de 1991 no seu Artigo 3.° (Liberdade de exercício do direito de reunião e de manifestação) que “todos os cidadãos têm o direito de se reunirem e manifestarem livre e pacificamente, em lugares públicos, abertos ao público e particulares, independentemente de qualquer autorização, para fins não contrários à lei, à moral, à ordem e tranquilidade públicas e aos direitos das pessoas singulares e colectivas”.

Há no entanto, no Artigo 4.° da mesma lei, três disposições que tratam das “Limitações ao exercício deste direito” e que são indispensáveis para que direitos e deveres convivam em harmonia, senão vejamos: 1. O exercício do direito à reunião e manifestação não afasta a responsabilidade pela ofensa à honra e consideração devidas às pessoas e aos órgãos de soberania. 2. Não é permitida a realização de reuniões ou manifestações com ocupação não autorizada de locais abertos ao público ou particulares. 3. Por razões de segurança, as autoridades competentes poderão impedir a realização de reuniões ou manifestações em lugares públicos situados a menos de 100 metros das sedes dos órgãos de soberania, dos acampamentos e instalações das forças militares e militarizadas, dos estabelecimentos prisionais, das representações diplomáticas ou consulares e das sedes dos partidos políticos. 

Esta didáctica introdução faz-se necessária, pois há casos em que a circulação de informações meramente especulativas e inverdades tenta sobrepor o improviso em substituição ao pacto social previsto na Lei. A saúde de uma democracia dá-se na permanente observância dos direitos e deveres. Por isso, no caso específico dos “motoqueiros”, como tem sido chamado na imprensa, distante do calor especulativo, a acção da justiça em nenhum momento deve ser analisada sob a óptica de uma prática de censura. O que tem sido julgado são os actos de vandalismo e de perturbação  à ordem e tranquilidade  públicas.

Sabemos que muitas vezes a  tentativa de desviar o foco dos desacatos praticados pelos “motoqueiros” em questão, esquece que para que seja reivindicado o direito de manifestar é preciso lembrar, antes de tudo, que este direito exige-lhe um dever, sobretudo o dever de respeitar o direito do outro.

Recordemos casos semelhantes em que “cidadãos angolanos protestaram”, como nos episódios das manifestações de Luanda sobre a proposta da Lei de repatriamento de capitais, a marcha pela destituição do Administrador do Cazenga, as marchas cívicas e passeatas dos “motoqueiros” nas Lundas Norte e Sul e as  manifestações dos adolescentes do Bairro Tchavola que reclamavam  melhorias nas condições sociais e abastecimento de água  e luz, todos exerceram os seus direitos e não houve nenhum registo de manifestante molestado, detido, julgado ou condenado. O que consolida o Acórdão do Tribunal Provincial de Malanje sobre os “motoqueiros” manifestantes como o estrito cumprimento da Lei.

Foram pisoteadas normas cívicas e transformado o direito à manifestação, assegurado na Lei, num momento de violência primária.

Não é prudente que alguns sectores da nossa sociedade  tentem dar a este episódio uma dimensão repressiva onde apenas a versão distorcida da realidade tenha valor. As recentes acusações de práticas de intolerância política e de repressão contra os manifestantes são incoerentes e completamente ao arrepio do novo ciclo que o país vive.

É importante que seja enfatizado que os  “motoqueiros”, são cidadãos angolanos que agiram à margem da lei e que apenas sete  foram julgados e condenados. Foi  uma minoria, aqueles que cometeram actos de vandalismo e ressaltando que um deles foi absolvido por insuficiências de provas. .Daí a naturalidade das actividades da justiça diante de mais um caso enquadrado como alheio ao que está previsto na Lei, o verdadeiro e único pacto social a ser respeitado por todos os angolanos.

Por tudo isso, e porque no caso de Malanje houve um inequívoco episódio de perturbação à ordem e tranquilidade públicas, devemos recorrer mais uma vez ao que está previsto na Lei de Maio de 1991: “Os abusos cometidos no exercício do direito de reunião e manifestação, sujeitam os infractores às penas de sanções previstas na lei, sempre que elas possa haver lugar.” (Artigo 14.° - Infracções e sanções) JA

 * Director nacional da Comunicação Institucional e Imprensa.

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