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Domingo, 10 Novembro 2019 21:12

Pressionado por militares, Evo Morales renuncia à Presidência da Bolívia

O presidente da Bolívia, Evo Morales, e o vice-presidente, Álvaro García Linera, renunciaram a seus cargos neste domingo encurralados pelo levante popular contra o Governo e abandonados pelas Forças Armadas, pela polícia e até por colaboradores mais próximos.

O comandante do Exército, Williams Kaliman, tinha pedido sua renúncia horas antes: “Depois de analisar a situação conflituosa interna, sugerimos que o presidente do Estado renuncie a seu mandato presidencial, permitindo a pacificação e a manutenção da estabilidade pelo bem de nossa Bolívia”. A Bolívia se encontra em um vazio de poder, após a renúncia dos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados. O líder do protesto social, o líder dos comitês cívicos, Luis Fernando Camacho, pediu a formação de uma junta de Governo com o alto comando militar e policial.

"É minha obrigação como presidente indígena e de todos os bolivianos garantir a paz social", disse o presidente boliviano no início de sua mensagem de renúncia. "Renuncio para que [Carlos] Mesa e [Luis Fernando] Camacho não continuem a maltratar os familiares de nossos companheiros, não continuem atacando ministros e deputados, para que parem de maltratar os mais humildes”, disse Morales. “A luta não termina aqui. Os humildes, os patriotas, vamos continuar lutando pela igualdade e a paz. Espero que tenha entendido minha mensagem, Mesa e Camacho, não prejudiquem os pobres, não causem danos ao povo. Queremos a volta da paz social. Grupos oligárquicos conspiraram contra a democracia. Foi um golpe de Estado cívico e policial. Dói muito o que se passou”, explicou.

Por sua parte, o vice-presidente Álvaro García Linera fez um balanço das conquistas econômicas e sociais do Governo durante os quase 14 anos de mandato, antes de apresentar sua renúncia. “Erguemos a Bolívia. Em 20 de outubro quase a metade dos bolivianos votou em nós. Forças estranhas e obscuras, a partir desse momento, começaram a conspirar. Queimaram instituições e sedes sindicais. Formaram bandos paramilitares para intimidar os camponeses, ameaçaram nossos companheiros. Foi um golpe de Estado. Eu também renuncio. Sempre fui leal ao presidente, estou orgulhoso de ter sido o vice-presidente de um indígena e o acompanharei nos bons e nos maus momentos”, afirmou García Linera.

O presidente boliviano já havia cedido à pressão neste domingo e anunciado novas eleições, após 18 dias de protestos em que pediam a anulação das eleições de 20 de outubro, nas quais foi reeleito. Tudo depois que a Organização dos Estados Americanos (OEA) divulgou uma auditoria do processo eleitoral em que afirma que os procedimentos adequados não foram seguidos e houve "contundentes" irregularidades, motivo pelo qual exigia sua anulação. Seguindo a recomendação da OEA, Morales anunciou –em uma mensagem televisionada na madrugada deste domingo– sua intenção de "renovar todos os membros do Tribunal Supremo Eleitoral". O presidente insistiu que, com sua decisão, buscava "baixar toda a tensão" e "pacificar a Bolívia". Sem aparente sucesso. O Ministério Público anunciou neste domingo uma investigação contra os membros do Tribunal Eleitoral suspeitos de irregularidades. A presidente da instituição, María Eugenia Choque Quispe, apresentou sua demissão imediatamente depois.

A oposição, liderada pelo candidato e ex-presidente Carlos Mesa, queria que Morales e seu vice-presidente, Álvaro García Linera, garantissem que não participariam das novas eleições, bem como um acordo plural para eleger um Tribunal Eleitoral credível. Os responsáveis pelos protestos que convulsionam o país acreditam, além do mais, que a renovação do órgão eleitoral é insuficiente e querem a renovação de todos os poderes do Estado e a criação de uma "junta de governo” transitória, escolhido pelo povo sublevado, que se encarregue das novas eleições.

O destino de Morales estava por um fio. O Governo entrou em colapso, pressionado pelo assédio de movimentos insurgentes que atacam as casas dos líderes governistas. O ministro da Mineração, César Navarro, colaborador próximo do presidente, renunciou neste domingo depois que uma multidão incendiou sua casa em Potosí, que atualmente é a cidade mais radicalizada contra Morales. O mesmo aconteceu com o também potosino Víctor Borda, presidente da Câmara dos Deputados, que, com sua renúncia, disse querer proteger seu irmão que está sendo mantido refém pelos manifestantes. O ministro dos Hidrocarbonetos, Luis Alberto Sánchez, também anunciou sua renúncia neste domingo por meio de um anúncio no Twitter. Antes deles, haviam renunciado diplomatas, governadores, prefeitos, deputados e outros altos funcionários do Estado.

A Central Operária Boliviana, a associação de sindicatos urbanos, aliada ao partido no poder, em uma decisão digna de registro, também pediu a renúncia de Morales. Vários sindicatos de mineiros, afiliados à Central, estão atuando contra o presidente, seguindo os comitês cívicos de suas regiões. Na prática, Morales apenas conta com o apoio dos sindicatos de camponeses, que ainda bloqueiam as estradas que levam a La Paz, a capital administrativa.

Há dois dias a polícia está amotinada e nos quartéis. Juntaram-se desta maneira aos protestos contra um Governo que, consideram, "maltratou e marginalizou" os policiais – um fator-chave para conduzir a situação em favor dos rebeldes. Durante seu mandato, Morales removeu algumas atribuições da instituição policial, como a administração do sistema de identificação, e preferiu confiar nas Forças Armadas que, no entanto, não quiseram defendê-lo nesta crise.

O principal líder dos comitês cívicos que lideram os protestos, Luis Fernando Camacho, aguardava a chegada de numerosos grupos de opositores que viajam a La Paz para levar uma carta de renúncia preparada para Morales assinar e "ingressar" no palácio Governo O presidente está em sua região, o Chapare, cercado por seus leais camponeses das plantações de coca.

Bolsonaro e o golpe

Áudios revelados neste domingo mostram que há um envolvimento do governo de Jair Bolsonaro na tentativa de golpe de Estado no país vizinho. Em uma das gravações publicadas pelo El Periódico, um interlocutor revela o apoio “das igrejas evangélicas e do governo brasileiro”, e fala de um suposto “homem de confiança de Jair Bolsonaro, que assessora um candidato presidencial”.

O áudio não especifica qual, mas bate com as informações de que o Itamaraty está desde maio em conversas frequentes com o líder opositor Luis Fernando Camacho, do Comitê Cívico, o mesmo partido do candidato Carlos Mesa, segundo colocado nas eleições de outubro.

Em publicação, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) comentou a queda de Evo no país vizinho. “Denúncias de fraudes nas eleições culminaram na renúncia do Presidente Evo Morales. A lição que fica para nós é a necessidade, em nome da democracia e transparência, contagem de votos que possam ser auditados”, disse.

Lula e Gleisi falam em "golpe" contra Evo Morales na Bolívia

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), afirmaram neste domingo, 10, que o ex-presidente Evo Morales, da Bolívia, que renunciou neste domingo, sofreu um "golpe de estado" coordenado pela elite econômica.

"Acabo de saber que houve um golpe de estado na Bolívia e que o companheiro Evo Morales foi obrigado a renunciar. É lamentável que a América Latina tenha uma elite econômica que não saiba conviver com a democracia e com a inclusão social dos mais pobres", escreveu o ex-presidente Lula, que deixou a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba na sexta-feira, após 580 dias preso. Lula cumpria pena pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex.

Por sua vez, Gleisi Hoffmann afirmou que a "direita não combina com democracia" e falou em outro "golpe" na América Latina. Segundo ela, tirar Evo da presidência é desconhecer o resultado da eleição. "E não se submeter a outra é típico da elite atrasada, violenta e submissa ao capital. Agora vão tirar os direitos do povo boliviano. Já conhecemos esse script", escreveu Gleisi.

Maduro diz que Evo Morales foi vítima de golpe

Nicolás Maduro também usou o Twitter para dizer que Evo Morales foi vítima de um golpe de Estado. “Condenamos categoricamente o golpe de Estado consumado contra o presidente Evo Morales.”

O ditador também exigiu “a preservação da vida dos povos indígenas bolivianos vítimas de racismo”. 

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