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Segunda, 18 Dezembro 2017 11:59

Só mil milhões?

O projecto de “Amnistia Económica”, que os Jovens Associados em Prol da Agricultura, Saúde, Educação e Ensino (JADASE)  propõem no quadro do combate à corrupção em Angola, é de louvar.

Por José Luís Mendonça

Há apenas uma ressalva: o valor de mil milhões de dólares (cerca de 850 milhões de euros) que esta associação avançou como valor aproximado dos capitais que devem ser repatriados para Angola parece um cálculo muito por baixo do valor dos fundos trasladados para o exterior.

Mil milhões de dólares não tem equivalência proporcional ao volume de divisas geradas pela economia nacional e perdidas durante as três últimas décadas, tanto com as exportações do crude, quanto com as aquisições de serviços e equipamentos (com ênfase para os militares) e que se presume terem sofrido sobrefacturação e “michas” diversas pagas lá fora. Se tivermos em conta a dívida contraída pela Sonangol não se sabe como (ninguém nunca nos disse nada), no valor de 13 mil milhões de dólares, mais o dinheiro da venda dos diamantes, da madeira, do ferro, do caranguejo grande do Namibe que nunca mais vimos nos nossos restaurantes (até parece que o colono levou as sapateiras todas para Lisboa em 1975), mais as divisas da exportação do pescado, não serão apenas mil milhões de dólares que devem ser repatriados para o país de todos nós no sacrifício, mas de alguns poucos no usufruto do bem-estar.

Outro aspecto importante que tem a ver com este projecto de repatriamento é o que diz respeito ao circuito de capitais derivado das relações económico-financeiras internacionais. Quando se acentuou a crise económica em Angola, muitas empresas internacionais a operar aqui fecharam as portas, por falta de divisas para expatriar os dividendos das suas prestações no nosso território.

Ora bem. E então as empresas angolanas que operam no estrangeiro não deviam, de igual modo, repatriar para Angola os dividendos (depois de pagos os impostos lá fora) dos lucros obtidos? Ou o princípio da exportação dos lucros só se aplica às empresas estrangeiras a operar em Angola?

Por isso, eu acredito que será muito mais de mil milhões o montante de dinheiro que os nossos compatriotas levaram do BNA ou de transacções feitas lá fora em nome do Estado, sem pensar sequer nas necessidades do povo que perdeu milhares dos seus filhos na batalha do Kuito Kuanavale para que eles pudessem governar e governar-se em Luanda.Por exemplo, em vez de erguer o monumento ao Soldado Desconhecido (não sei como é que as FAPLA e as FAA têm soldados desconhecidos), os 12 milhões de dólares teriam sido melhor aplicados em postos de saúde,escolas e rodovias secundárias nas comunas de onde foram recrutados os mancebos mortos nas guerras contra os boers.

Também nunca ninguém nos disse se esse dinheiro que saiu do país pagou os devidos impostos, porque sempre que um cidadão faz uma transferência, nem que seja de cem dólares para um familiar lá fora, o banco desconta-lhe uma parcela.

Há ainda os lucros gerados pelo Fundo Soberano que, como disse há tempos o seu presidente, José Filomeno (Zenu) dos Santos, fez investimentos em países da “África a sul do Saara”, ao “alocar metade da sua dotação inicial a investimentos de renda fixa e de aplicações de tesouraria emitidos por Estados, instituições supranacionais, acções globais e emergentes, bem como a investimentos alternativos em mercados emergentes ao nível mundial”. E os lucros obtidos com esses investimentos? Estamos a chegar ao fim do ano e do presidente do Fundo Soberano só estamos a ver o mesmo sorriso de sempre. Ora, o povo angolano não vive disso. Que Zenu dos Santos entregue ao erário os lucros dos investimentos feitos. Aí poderemos dar razão ao pai dele, quando disse, há dias, que o conceito de nepotismo evoluiu ao privilegiar a competência de um gestor ainda que este seja filho de quem o nomeia. Se Zenu não nos entrega nada, então cabe ao Presidente da República nacionalizar o Fundo Soberano, o que seria um pleonasmo, está-se mesmo a ver.

A China também investiu parte do seu Fundo Soberano em Angola e noutros países africanos. Mas, perguntem a Xin Jinping se os lucros do CIF e outras entidades financeiras do país do dragão não têm retornado para a China. Perguntem, perguntem... JA

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