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Domingo, 18 Mai 2014 13:36

Ministério da Cultura proíbe peça de teatro que fala sobre a corrupção

Decisão foi equiparada a censura pelo teor político do espectáculo. Ministério da Cultura de Angola argumenta com falta de condições de segurança.O Ministério da Cultura de Angola cancelou em cima da hora as duas apresentações da peça As orações de Mansata, uma co-produção da Cena Lusófona, Associação Portuguesa para o Intercâmbio Cultural, e companhias teatrais portuguesas, angolanas e brasileiras, alegando a falta de condições de segurança da sala do Nacional Cine-Teatro de Luanda, onde o espectáculo foi montado.

“Não é fácil explicar o sucedido. Vamos falhar um compromisso por razões que nos ultrapassam”, lamentou Pedro Rodrigues, da Cena Lusófona, contactado pelo PÚBLICO em Luanda. Segundo explicou, nunca durante todo o processo de agendamento e preparação do espectáculo foi dado conhecimento de qualquer problema técnico, estrutural ou de segurança da sala do cineteatro, que pertence ao Ministério da Cultura de Angola e é gerida pela associação Chá de Caxinde.

O cancelamento do espectáculo causou algum “frissom” em Luanda e nas redes sociais, onde a decisão governamental foi equiparada a censura pelo teor político do espectáculo. “Este espectáculo fala da luta de poder, dos conflitos entre aqueles que lutam para obter poder e da corrupção”, explica Pedro Rodrigues. “Não é sobre a realidade angolana, mas essa associação foi feita aqui em Luanda”, reconheceu.

A interdição da sala de espectáculos foi comunicada por correio electrónico três horas antes da estreia da peça — um texto do escritor guineense Abdulai Sila que é uma adaptação do famoso Macbeth de William Shakespeare, e que já foi apresentado em Portugal, Espanha e Guiné-Bissau e deveria terminar a sua itinerância internacional na capital angolana, nos dias 16 e 17 de Maio.

Este sábado, a Cena Lusófona foi convocada para uma reunião de emergência com a ministra da Cultura angolana, Rosa Cruz e Silva, que, segundo Pedro Rodrigues, “disse que não tinha conhecimento que o teatro estava a funcionar e que nos preparávamos para apresentar o espectáculo”, uma explicação que a associação portuguesa não entende, uma vez que a ministra participou em reuniões e conferências de imprensa sobre o projecto e foi convidada a assistir à estreia.

No mesmo encontro, a governante “colocou a possibilidade de o espectáculo poder ser apresentado noutras salas, desde que tecnicamente possível”. Essa solução vai ser agora avaliada pela Cena Lusófona, que foi forçada a devolver os cerca de 300 bilhetes vendidos para as apresentações no Nacional Cine-Teatro, que tem estado a funcionar regularmente desde Março, depois de obras de reparação.

Nenhuma das duas alternativas apresentadas são salas de espectáculos: trata-se do palco de um salão de festas e de um espaço num centro de conferências, que teriam de ser adaptados para acolher uma produção teatral.

“Vamos ter de avaliar se é ou não possível. Só podemos apresentar o espectáculo se estiverem garantidas as condições mínimas técnicas e de segurança”, afirmou Pedro Rodrigues, acrescentando que também do ponto de vista financeiro “é complicado” prolongar a estadia da comitiva de 22 pessoas envolvidas na produção.

O espectáculo integra-se no projecto P-Stage, um projecto de formação, criação e difusão teatral financiado pela União Europeia e que envolve actores de língua portuguesa. Os parceiros da Cena Lusófona na produção de As orações de Mansata foram o Elinga Teatro de Angola, a Companhia de Teatro de Braga e A Escola da Noite, ambas portuguesas, e ainda o Teatro Vila Velha de Salvador, no Brasil.

Público.pt/AO24

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