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Sexta, 06 Julho 2018 17:09

Juízes entendem que jornalistas absolvidos no tribunal de Luanda cumpriram as regras

O tribunal de Luanda entende que os dois jornalistas angolanos acusados por injúrias pelo ex-Procurador-geral da República, hoje absolvidos, observaram todas as regras jornalísticas na elaboração da notícia sobre corrupção, contestada pelo general João Maria de Sousa.

Rafael Marques e Mariano Brás estavam acusados pelo Ministério Público, após queixa-crime movida pelo ex-Procurador, da prática de crimes de injúria e ultraje a órgão de soberania, através de uma notícia publicada em 2016, visando João Maria de Sousa, mas foram absolvidos de todas as acusações.

"Os réus Rafael Marques e Mariano Brás exerceram o dever de informar com objetividade, pelo que as suas condutas não ultrapassaram a fronteira penalmente censurável, tendo-se mentido dentro dos limites admissíveis do direito de informação, não preenchendo assim o tipo de ilícito de injúrias, nem aliás qualquer outro", disse a juíza da causa, Josina Ferreira Falcão, na leitura da sentença.

A defesa do ex-Procurador-geral da República não prestou declarações aos jornalistas, mas admitiu, durante a sessão, recorrer desta decisão, enquanto Salvador Freire, um dos advogados de defesa, afirmou que absolvição já era esperada, por manifesta falta de provas, valorizando o "bom começo" que a Justiça angolana vive.

"Pensamos que os momentos são diferentes e atualmente, estamos em crer também, que esta ação dos jornalistas, de poderem fazer denúncias de casos de corrupção, vai continuar", afirmou o advogado.

Em causa neste processo está uma notícia de novembro de 2016, divulgada no portal de investigação Maka Angola, do jornalista Rafael Marques, com o título "Procurador-geral da República envolvido em corrupção", que denunciava o negócio alegadamente ilícito realizado por João Maria de Sousa, envolvendo a aquisição - e a forma como foi feita - de um terreno de três hectares, em Porto Amboim, província angolana do Cuanza Sul, para construção de condomínio residencial.

A notícia foi posteriormente retomada por Mariano Brás para a sua publicação semanal O Crime, o que motivou João Maria de Sousa a acusar os jornalistas de crimes de injúria e ultraje ao órgão de soberania.

"Porém, verdade é, e não devemos discordar, que aqueles atos praticados pelos funcionários da administração [municipal, no registo dos terrenos] demonstram facilitação, pois como justificar a ausência de documentos importantes, como justificar que nem sequer procederam à cobrança do valor que a própria lei é clara em estabelecer (...) mas procederem ao trabalho que antes deveria ser pago e não foi", alertou a juíza.

"Não há como evitar que o nome e os interesses do ofendido não estejam vinculados ou envolvidos em situações de irregularidades aberrantes praticados pela administração. Que no bom rigor assentam muito bem tais práticas no conceito espelhado nestes autos, de corrupção", enfatizou Josina Ferreira Falcão, na leitura da sentença.

Desta forma, o tribunal entendeu que "não se apresenta como gratuita, desproporcionada ou sem correspondência com o interesse geral de informação" o conteúdo da notícia, acrescentando que Rafael Marques "observou as regras da atividade de jornalística.

"Observando o dever prévio de informação e teve fundamento sério, quer para noticiar o que noticiou, quer para perspetiva uma queixa-crime contra os funcionários da administração, por parte do denunciante, quer ainda para figurar a verificação de um crime de abuso de função por parte dos agentes da administração ou do governo da província sul", disse.

Sobre as queixas de injúrias por parte do ex-Procurador, o tribunal absolveu ambos, considerando: "Não podemos afirmar que são lesivas à honra e consideração do ofendido [general João Maria de Sousa], pois a mera suscetibilidade pessoal não revela para efeitos penais".

Sobre a acusação do crime de ultraje a órgão de soberania, devido a uma passagem da notícia de Rafael Marques, referindo a alegada proteção de José Eduardo dos Santos, então Presidente da República, ao, à data, Procurador João Maria de Sousa e ofendido neste processo, o tribunal considerou que a mesma resultou apenas da "crítica", enquanto jornalista.

Acrescentou que ficou a dever-se "à falta de resposta" do Presidente da República às queixas que Rafael Marques formalizou junto do chefe de Estado, sobre a atuação de João Maria de Sousa. Pelo que, "ponderados os contextos", disse a juíza da causa, "não podemos afirmar que são lesivas à honra do Presidente da República".

Por estes motivos, anunciou, os juízes decidiram, em conferência, absolver ambos os jornalistas e "mandá-los em paz".

 

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