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Sábado, 08 Setembro 2018 00:48

O fim da “bicefalia” e o início da renovação interna do MPLA

Decididamente, o MPLA entra amanhã numa nova era. A maior formação política angolana realiza sábado o seu VI Congresso Extraordinário para consagrar a transição na sua liderança, com José Eduardo dos Santos a passar o testemunho a João Lourenço.

Por Filomeno Manaças

Um momento esperado com particular expectativa, tendo em conta que, desde a tomada de posse de João Lourenço como Presidente da República, e na sequência da narrativa política reformista que imprimiu ao seu discurso, não tardaram a fazer-se sentir as ondas de choque no seio do MPLA.

A manifesta e visível diferença de opiniões - dada a ver entre o presidente e o vice-presidente do partido sobre questões sensíveis da política doméstica - arrastou consigo acalorados debates internos e fortaleceu, como corolário, o pluralismo de ideias e a democracia no seio do partido. Cedo os analistas e os políticos trataram de extrair da situação uma síntese para classificar o que estava a ocorrer. “Bicefalia” foi a designação encontrada para caracterizar o evidente descompasso político que, a nível do MPLA, se instalou.

Essa “bicefalia”, que desde a tomada de posse de João Lourenço como Presidente da República, há um ano, emergiu como factor perturbador do processo de mudanças desencadeado pelo Chefe de Estado a todos os níveis, termina precisamente amanhã.

João Lourenço soube, entretanto, usar a Constituição e as leis para prosseguir as mudanças, sem se deixar demover por aqueles que consideram que as mesmas estão a ser rápidas demais. E fê-lo - pode-se descortinar - por dois bons motivos: primeiro porque era preciso demarcar-se das práticas políticas nocivas que o MPLA se propunha corrigir e, segundo e por inerência, para criar a sua própria imagem de marca e desfazer a ideia equivocada de que seria uma figura política que iria caminhar à sombra do anterior Presidente da República.

Ao agir assim, o Presidente da República vincou a supremacia da Constituição e do poder que ela lhe confere face a eventuais formulações, no seio do seu próprio partido, alinhadas no contra ciclo das reformas que estava apenas a começar a implementar.

Tudo isso contribuiu decisivamente para clarificar também a questão da liderança do partido no poder. De resto, um período interessante de seguir, pelos lances políticos protagonizados, que o congresso extraordinário de amanhã se encarrega de encerrar.

Entretanto, não basta a mudança formal na liderança do MPLA. O que - digo-o sem receio de errar - a esmagadora maioria (quer dos militantes do partido no poder quer da sociedade em geral) espera é que João Lourenço, à semelhança do que está a fazer no Estado, também dinamize e conduza um processo de profunda renovação do MPLA. É o que têm afirmado, nos últimos dias, vários dirigentes, militantes e simpatizantes, assim como personalidades da sociedade civil e analistas independentes.

Um destaque particular vai para os delegados provinciais ao congresso do MPLA, que afluíram à capital ao longo da semana. As suas declarações à imprensa são claras: querem mais dinamismo por parte do partido, mais diálogo com a sociedade, mais democracia interna, mais responsabilização. O apoio da maioria dos membros do MPLA ao combate à corrupção e à impunidade é inequívoco.

Como disse à ANGOP o histórico do MPLA Marcolino Moco, desavindo com a anterior liderança, João Lourenço “tem capacidade para renovar o MPLA”. Não será fácil, pois as convicções e sobretudo as inércias do passado são muito fortes, não só em termos orgânicos e funcionais, mas também políticos, ideológicos e comportamentais. Daí, por exemplo, o fraco debate interno (que já foi maior no passado), a dificuldade de lidar com a sociedade (até em termos de linguagem, em especial no caso da juventude urbana), a deriva ideológica e o comportamento de muitos quadros, quando ocupam lugares de responsabilidade na função pública e no Estado.

João Lourenço sabe que tem de promover a renovação interna do MPLA com ponderação, cautela e equilíbrio, mas tem de fazê-lo, por duas razões. A primeira é que da renovação do MPLA depende o sucesso das reformas que está a imprimir a nível do Estado e da sociedade. A segunda é que, se não o fizer, corre o risco de perder popularidade, dificultando, assim, a sua reeleição em 2022.

Por seu turno, o MPLA precisa de acompanhar a dinâmica do presidente João Lourenço, se quiser inverter a tendência descendente, em termos de números de votantes, que se tem verificado desde 2008. Para continuar a ser a grande força dominante em Angola, o MPLA precisa de ajustar-se aos novos tempos e novos desafios, a todos os níveis. Para dar apenas três exemplos, tem de desburocratizar-se com urgência, modernizar o seu discurso político e encontrar estratégias mais refinadas e inteligentes de hegemonia.

O fim completo e inequívoco da “bicefalia” exige um alinhamento perfeito entre o MPLA e o seu novo líder. Neste momento, é o partido que tem de ir atrás de João Lourenço e não o contrário.

* Director Nacional de Publicidade. A sua opinião no engaja o Ministério da Comunicação Social. JA

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